sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

A CASA online

O projeto CASA versao digital está online na revista Interartive#27: www.interartive.org

Belo projeto Lucila Vilela

Georgia O'Keeffe

Ontem assisti o Filme sobre a vida de Georgia O'Keeffe
aqui está a sinopse.
Starring: Ed Begley Jr., Henry Simmons, Jeremy Irons, Joan Allen, Kathleen Chalfant, Linda Emond, Tyne Daly Genre: True Story
When fiercely independent and then-unknown female artist Georgia O’Keeffe (Joan Allen) discovers famed photographer and art impresario Alfred Stieglitz (Jeremy Irons) is displaying her drawings in his gallery without her permission, she confronts him and orders him to remove the collection. But Georgia finds herself taken with Alfred’s charms as he convinces her to allow him to become her benefactor and to champion her artistry. Their working relationship evolves as they fall deeply in love and Alfred eventually leaves his wife for Georgia. She soon becomes a rising star who is poised to eclipse Alfred’s light. As their relationship suffers, Alfred finds twisted ways to emotionally wound her, including taking a younger lover. Georgia’s search for solace moves her west, where she finds new inspiration for her paintings – and ultimately her own voice – in the New Mexico landscape. To find out more about the life of Georgia O'Keeffe, go to The Georgia O'Keeffe Museum. [1] [1] http://www.okeeffemuseum.org/

O objetivo da arte

Giorgia O'Keeffe pursued studies at the Art Institute of Chicago (1905–1906) and at the Art Students League, New York (1907–1908), where she was quick to master the principles of the approach to art-making that then formed the basis of the curriculum—imitative realism. In 1908, she won the League's William Merritt Chase still-life prize for her oil painting Untitled (Dead Rabbit with Copper Pot). Shortly thereafter, however, O'Keeffe quit making art, saying later that she had known then that she could never achieve distinction working within this tradition.

Her interest in art was rekindled four years later (1912) when she took a summer course for art teachers at the University of Virginia, Charlottesville, taught by Alon Bement of Teachers College, Columbia University. Bement introduced O'Keeffe to the then revolutionary ideas of his colleague at Teachers College, artist and art educator Arthur Wesley Dow.

Dow believed that the goal of art was the expression of the artist's personal ideas and feelings and that such subject matter was best realized through harmonious arrangements of line, color, and notan (the Japanese system of lights and darks). Dow's ideas offered O'Keeffe an alternative to imitative realism, and she experimented with them for two years, while she was either teaching art in the Amarillo, Texas public schools (1912-14) or working summers in Virginia as Bement's assistant.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Vozes do Silêncio -

As vozes do silêncio: corporeidade, dança e perdão nas políticas afirmativas educacionais sul-africanas pós-apartheid
Resumo
A pesquisa proposta não pretende tratar da dança na escola, mas sim sobre a formação de professores e a relação com a dança enquanto atividade artístico educativo, num contexto com desafios políticos de diálogo com a diferença sugeridos pelos processos de reconciliação, tal com é atualmente a África do Sul. Assim, o presente projeto de pesquisa propõe entrelaçar os fios soltos da arte, da educação e da filosofia envoltos no corpo, na dança e na escritura com intuito de tecer uma trama de acolhimento daquilo que nos é estranho. Nossa idéia ao justificar este projeto está em investigar como ensinar alguém a dançar, isto é, observar, descrever, executar, criar e apreciar a dança poderá ou não contribuir com a compreensão do seu processo de vida e possibilitar esta pessoa reconciliar consigo mesmo e com o mundo.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Exposição CASA

Casa-corpo
Se para Lygia Clark “o corpo é a casa” a exposição de Lucila Vilela, ocorrida no mês de outubro em uma residência localizada na Rua Acadêmico Reinaldo Consoni, 122, Córrego Grande, Florianópolis, mostrou-me que a casa também é corpo. A exposição intitulada “Casa” reuniu no mesmo lugar objetos e performances. As proposições de Lygia Clark e o espaço-comportamento das possibilidades abertas de Hélio Oiticica problematizam a condição sujeito-objeto e fundam uma outra relação: a artista-obra-espectador. Semelhantemente, as experiências vivenciadas na exposição “Casa” sugerem uma analogia com três dimensões uma ontológica, outra espacial e ainda uma estética...

Veja a casa na web:
http://expo-casa.blogspot
www.interartive.org/3tips.htm
O projeto Improvisação em contato: poéticas do corpo convida a todos para a palestra Que sei eu? Uma coreografia que interroga o ser-no-mundo, com Ida Mara Freire, Profª Drª do Centro de Educação da UFSC. Será no dia 16 de novembro (terça-feira), às 16h30, na sala CFM402 (Artes Cênicas UFSC).

“Que sei eu?” Indaga Merleau-Ponty (2000), sem querer explicitar o que é o saber. Mas, o que há? E ainda, o que é o há? Essas questões interrogam a nossa própria existência. E foi refletindo sobre a própria existência de dançarinos com cegueira que criamos uma coreografia que interroga o si e o mundo. Buscamos desvelar qual seria a questão existencial que cada dançarino não-visual trazia em si e, a partir daí, criamos coreografias indagativas.



Até lá!
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Grupo de Extensão Improvisação em contato: poéticas do corpo
PROEXT 2009 - MEC/SESu
Artes Cênicas - UFSC
Equipe: Ana Alonso, Claudinei Sevegnani, Janaina Martins, Nastaja Brehsan, Tamara Hass.
www.poeticasdocorpo.wordpress.com

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Vídeos do Potlach no youtube

Os vídeos dança do POTLACH estão disponíveis no You Tube


Muitos indagam: Dança com dançarinos cegos? Cegos?!! Dança?!! Que dança é essa? Que movimentos são esses? Que corpo é esse? Quais sentidos, sensações, direções? A resposta: "Que sei eu?" Pois,…
Adicionado em 30/7/2010

http://www.youtube.com/watch?v=nD14ezRLJsM


O endereço do "quatro" no youtube:
http://www.youtube.com/watch?v=9JXwyqTfxmg

Apreciem e deixe seu comentários por aqui...

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Encontro com Bill T. Jones

Diário de Bordo
NY, 24 de Julho de 2010.
Foi com muita alegria que pude no final do espetáculo receber o caloroso abraço e tirar fotos na companhia de Bill T. Jones. Creio que meu primeiro contato com o trabalho dele foi em 96 quando participei de Festival de Joinville e adquiri o vídeo Last Supper at uncle Tom´s Cabin/The promissede Land, os temas que ele trata me chamaram atenção de cara, fé, política, relações étnico-raciais, sexualidade. Desde então, tenho acompanhado o trabalho dele, de longe, mas sempre admirando sua coragem, originalidade de juntar em cena temas tão controversos. Durante o intervalo da conferência numa conversa com Selma Treviño, dançarina brasileira que mora a 7 anos em NY, ela perguntou se eu tinha visto o espetáculo, fiquei animada com a idéia, ao voltar para o hotel, tratei de comprar o ingresso para sábado, último dia, já que eu voltaria na segunda, bem na lida com o universo on-line, saiu lá número da poltrona 8 fila j, localização de primeira, não vou enconomizar para ver o Bill T. No sábado, me arrumei belamente, e chamei um taxi nas movimentadas ruas da downtow as 6 horas tudo com tempo, tinha olhado google maps, calculei chegar bem, antes e lá estava eu 7:20 no Lincoln Center, quando o vi o tamanho do lugar me assustei, pois se tratava de um complexo de prédios com teatro, cinema, etc... me deram a informação cujo ponto de referência era um alvo móvel, um ônibus, lá fui nervosa resolvi, confirmar e acabei me perdendo a hora se aproximava, e a maioria que perguntava não sabia também, por fim alguém com seu iphone localizou o endereço no google maps e lá fui, o teatro ficava no quinto andar de um shooping center, não foi fácil, achá-lo mas as 08 horas na poltrona 8 estava eu sentada, ouvindo o sinal. A localização do assento excelente, conseguia até ver os músculos em ação dos dançarinos. E sem intervalo, apreciar a obra prima de Bill T. Jones, na saída próximo de mim encontrei o Bjorn Amelan, que tinha conhecido na Conferência da Associação do Críticos, aonde ele tinha ido falar sobre dança, política e ativismo, conversamos um pouco, falei que era brasileira, depois encontramos a responsável figurino, senti que havia a possibilidade de ver Bill T. Jones, e lá fui, muito amigável, perguntou meu nome, disse que era musical, falou do meu sorriso, perguntou se eu era dançarina, se eu tinha gostado do espetáculo, tirámos foto, troquei contatos com o Bjorn, e saí dali, comprei camiseta, livro dos 25 anos da companhia, e senti aquele prazer, que tinha um sentido maior de ter feito aquela viagem.

Fondly Do We Hope...

Sensível e Inteligível
Por Ida Mara Freire

"Eu vivo com a sensação desconfortável de que a sociedade moldou-me como um resultado de algo que foi roubado de nós, quando Abraham Lincoln foi morto. O cinismo e a alienação que eu sinto na minha cabeça e coração surgiu por causa dessa estranha reviravolta do destino”, palavras do dançarino e coreógrafo Bill T. Jones acerca de sua monumental obra “Fondly Do We Hope... Fervently Do We Pray” encenada no Rose Theather, Lincoln Center, Nova York durante o mês de julho.

Neste trabalho os temas: raça, guerra e escravidão forma aprofundados. E vislumbrou-se no palco a diferença entre o que é e o que poderia ter sido a América se Abraham Lincoln não fosse assassinado. Essa relação entre o passado, o presente e o futuro fundou-se na experiência do vivido corporal de Antonio Brown, Asli Bulbul, Peter Chamberlin, Talli Jackson, Shayla-Vie Jenkins, LaMichael Leonard, Jr., I-Ling Liu, Paul Matteson, Erick Montes, Jennifer Nugent, dançarinos da Bill T. Jones/Arnie Zane Companhia de Dança. Em cena vimos espelhado a condição humana que compartilhamos uns com os outros ao longo do tempo, na cultura, e na nossa pertença étnico-racial. Seus gestos compostos de músculos, sangue e carne, desvelam o coração da obra coreográfica e traduzem os dizeres do coreógrafo que o movimento está a serviço do sensível e do inteligível.
A cenografia do espetáculo criada por Bjorn Amelan contrastava um imperioso cilindro acortinado com seu tecido leve e transparente no qual era projetado excertos de textos que sinalizava, juntamente com o figurino de Liz Prince, à imaginação da platéia que testemunhava essa jornada aparentemente histórica. A trilha sonora original, composta por Jerome Begin, Christopher Antonio William Lancaster, George Lewis, Jr. executada ao vivo, incluía música tradicional, clássica, gospel, dando vida às próprias palavras de Lincoln, ao texto de Walt Whitman, além de notas autobiográficas que reverberavam na voz do narrador e no corpo do cantor.

“A peça estava linda... e a companhia, esses seres sublimes, estavam no seu melhor. O público deu-nos uma ovação de pé todas as noites” comenta Bill T. Jones orgulhoso. Eis o resultado de um trabalho criativo, de comunhão primorosa entre os elementos cênicos, texto, música, projeção, temática, metáforas, inferências, movimento, técnica e concepção, que confirma as palavras do coreógrafo, as quais o espectador deve levar em conta: “ Não há qualquer razão para separar dança e teatro.”



idamara@ced.ufsc.br

Espetáculo a serviço do sensível

Foto de Paul B. Goode




quinta-feira, 22 de julho de 2010

múltipla no idance

idanca.netDança Contemporânea no Brasil e no mundo
Patrocínio:
Petrobras
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Textos
Notações de multiplicidade
por Ida Mara Freire • 17/06/2010

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Uma versão preliminar do texto foi publicada no Jornal Notícias do Dia durante o evento.

Multiplicidade

A quinta edição do Múltipla Dança: Seminário Internacional de Dança Contemporânea, uma realização da Aliança Francesa de Florianópolis, Santa Catarina, ocorreu de 25 a 29 de março de 2010, tendo como participantes aproximadamente 900 pessoas. As organizadoras, Marta Cesar e Jussara Xavier, mais uma vez se desdobraram para colocar em foco uma programação diversa e aguardada pelo público de dança catarinense.

O Múltipla Dança, semelhante à web, pareceu-me ser uma fonte de inúmeras informações. Mas, as sugestões de rapidez, exatidão, multiplicidade, consistência, leveza, visibilidade, descritas por Ítalo Calvino me ajudaram a traçar um caminho, provocando as notas aqui expressas. Neste caso, a ação de anotar é destacada do saber como modelo, coisa para copiar, imitar. Ela é escritura, não memória; está na produção, diríamos, na criação e não na representação.

Os artistas e os trabalhos da dança catarinense foram o destaque do seminário, indicou a curadora Jussara Xavier: Anderson Gonçalves (1964-2010) foi homenageado; houve o lançamento do livro As metáforas do corpo em cena, de Sandra Meyer, e a estreia do documentário Ballet Desterro: contemporaneidade na dança catarinense, dirigido pela curadora; o Cena 11 compartilhou seu processo criativo com o público por meio de uma ação no palco e de uma conversa no dia seguinte; em ensaios abertos com discussão sobre dramaturgia, grupos e artistas de Florianópolis e Jaraguá do Sul conversaram com as professoras Christine Greiner e Sandra Meyer; foram promovidas atividades em parceria com o projeto Entrando em Contato, desenvolvido por Ana Alonso aqui na cidade; os videodanças de Sarah Ferreira foram exibidos. Outros destaques do seminário incluiram: o diálogo sobre economia da cultura com Ana Carla Reis. A presença da Quasar Cia. de Dança (GO), uma das mais importantes companhias brasileiras. A performance da Companhia Flutuante (SP) no Jivago Lounge, local que enfatizou o interesse do Múltipla em ocupar outros espaços, alcançar novos públicos, enfim, não perder de vista a multiplicidade, foco do encontro desde seu surgimento.

A dança aconteceu novamente na cidade múltipla e variada: muitas danças em contraposição a “uma”. Mas, não se trata de dispersão ilimitada, mas de número: quando a dança que se aprecia é uma e ao mesmo tempo múltipla. Mas, independentemente da ordem e da unidade que a dança receba, seja da sensibilidade e do intelecto, o espectador ao se deparar com a multiplicidade de conhecimento acerca da dança apresentada nas propostas, nos espetáculos, nas oficinas, nos debates e ensaios abertos do Múltipla Dança, sentiu-se desafiado a buscar sentido para tal experiência em todo esse conteúdo sensível. Neste estado aparentemente desconexo ou bruto, instaura uma experiência estética da dança que convida: aprecie com compreensão.


Instantâneos


No prefácio da obra de João Gilberto Noll: Mínimos, múltiplos, comuns, Wagner Carelli observa a aplicada disciplina desse autor de escrever narrativas completas e de porte incomum: cada relato estava confinado a um máximo de 130 palavras. Noll optou por chamá-los “instantes ficcionais”. Para exemplificar: “Como se chamava a sensação fluida de todo final de tarde? O sopro escorrendo pelo estômago sem desenlace seguro, o que era? Estava sentado num café, absorto nesse laivo de instante. E isso lhe deixaria aquele sumidouro de lembrança cada vez mais distantes de uma nascente precisa…” Esse fragmento nos impulsiona a indagar como o olhar, o escrever, o mover-se, revelam gestos instantâneos, cujo entrelaçamento forja o vídeo, o livro, e a dança.

Podem nossos olhos interrogar o mundo e, através deles, o mundo apresentar-se a nós? Ballet Desterro: contemporaneidade na dança catarinense, dirigido por Jussara Xavier, registra em voz e imagens a trajetória pioneira de um grupo que, como relata a arguta diretora, realizou experiências inovadoras ao adotar procedimentos criativos diferenciados do padrão e provocar a percepção do público. Identifica em seus espetáculos a articulação inédita de diferentes linguagens e mídias, a simultaneidade de ações na cena, a valorização da singularidade, a experimentação coreográfica, a diversidade de motivações e as tentativas de dirigir a dança às infinitas coisas do mundo. Observa a diretora: “Vale notar que não existia crítica de dança regular em Santa Catarina nesta época; ocasionalmente Janga, então membro da Associação Brasileira dos Críticos de Arte, a pedido dos próprios artistas, exercia este papel. É dele o texto de apresentação do espetáculo para o programa (1990): ‘a mais nova montagem do Ballet Desterro tem [...] em comum uma sintonização com a contemporaneidade, clara e acertada opção do grupo desde que iniciou sua trajetória. [...]’ Quem assistir a essa montagem, mesmo que não conheça os excelentes trabalhos anteriores do Desterro, como Elo e Quatro Visões, poderá concluir quão merecidas são as diversas premiações conquistadas pelo grupo. Fazendo bom uso da inteligência e sensibilidade, a arte do Ballet Desterro contagia e emociona com sua inventividade, energia e juventude. Seus bailarinos e coreógrafos recusam-se a fazer da dança mera diversão, ornamento ou passatempo social inconsequente. Colocando o público diante de seus próprios problemas interiores, buscam aumentar os níveis de experiência do intérprete ou da platéia.” O Desterro passo-a-passo firmou-se no cenário cultural como uma referência e deixou sua marca indelével na dança catarinense.


Seria a escrita da dança um mapeamento e codificação literários das regiões do corpo? O livro As metáforas do corpo em cena, de Sandra Meyer, é resultante da sua tese de doutorado e relaciona o método das ações físicas com estudos do corpo na contemporaneidade. Os processos cognitivos que envolvem a formação do ator e do bailarino são discutidos no âmbito das ciências, da filosofia e das artes, a partir do problema corpo-mente. “Ao colocar lado a lado os ensinamentos dos grandes mestres de teatro com novas possibilidades de uma teoria da ação, Sandra depura algumas questões fundamentais como a da metáfora, entendida na pesquisa à luz dos estudos do próprio Mark Johnson e de seu parceiro George Lakoff. Para estes autores, a metáfora não é uma figura de linguagem, mas uma ação cognitiva capaz de criar deslocamentos em toda criatura que pensa e se move. Esta ampliação da “ação” para diferentes níveis de descrição do corpo (e não apenas o macroscópico) abre caminhos para estudos do teatro contemporâneo, em suas relações com a performance e o chamado teatro pós-dramático. Isso porque, nestes casos, a ação nem sempre é exposta, mas se dá a ver sutilmente, através de mudanças de estados corporais”, prefacia Christine Greiner.


Como o gesto daquilo que fica em suspenso em cada ação busca um sentido? Anderson Gonçalves (1964-2010), bailarino, dançou em grupos como o Desterro (SC), Cia. Jazz Brasil (SP), Vacilou Dançou (RJ). Foi professor e coreógrafo de diversas escolas e grupos nacionais. Integrou o Cena 11 como intérprete e figurinista. À maneira de Clarice Lispector, ele interrompe a dança com silêncio espaçoso, e deixa o corpo num feixe de atenção intensa e muda. Ficamos à espreita de nada. Dancemos. Seu silêncio não é o vazio, é a plenitude.

Dual



Céu na boca / Foto: Lu Barcelos

A dualidade é um conceito definido pela geometria em que são chamadas de duais duas figuras que podem ser obtidas uma da outra. Refere-se à relação que une dois objetos quaisquer, de tal modo que um pode transformar-se no outro mediante operações oportunas. Camilo Chapela, Carolina Ribeiro, Fernando Martins, João Paulo Gross, Kaká Antunes, Marcos Buiati, Martha Cano e Valeska Gonçalves, elenco da Quasar Cia. de Dança (GO), rastejam, se arrastam, caminham, se abraçam, se afastam, se falam, se beijam: desenham acontecimentos de dança em busca da felicidade. Durante 70 minutos, seus gestos gotejam risos, alfinetam surpresas e sugerem sensações na plateia presente no espetáculo Céu na boca, dirigido por Henrique Rodovalho, e apresentado na noite de terça-feira no Múltipla Dança.

A musicalidade de Hendrik Lorenzen, Taylor Deupree, Marc Leclair, Goldie, Stacey Kent, Umebayashi Shigeru, Porter Ricks, Ray Conniff, dilatam o estado de espírito, nos colocando reféns dos desejos alheios manifestos num contato aparentemente absurdo, numa comunicação estranhada, num deslocamento horizontal. Impulsionam-nos a reconhecermos, numa atitude epicurista, que o conhecimento seguro dos desejos leva a direcionar toda escolha e toda recusa para a saúde do corpo e para a serenidade do espírito, visto que esta é a finalidade da vida feliz.

A movimentação de um corpo intenso e presente é vestida por Cássio Brasil. Camuflagem desnudada em cena com o intuito de assumirmos como nossas as ações de tecer, em duo, em trio, trançar fios existenciais que nos afaste da dor e do medo. A ausência de cenário metaforiza o outro como o céu, o ideal inatingível; e o corpo-próprio como a boca, a realidade palatável. Nessa atmosfera difusa, a iluminação faz nascer o corpo de outrem no tempo/espaço daquele que vê. Nas pausas contornadas pelo silêncio noto que não só o uso das palavras, mas também o movimento, o gesto, o tocar e o sorrir nos fazem singulares, neste desenho que é a pluralidade humana.


Presença


Diz que um objeto está presente quando é visto ou é dado a qualquer forma de intuição ou de conhecimento imediato. O que é a presença na dança? Na tarde de quarta-feira, a coreógrafa Zilá Muniz (Florianópolis/SC) mediou o diálogo entre Ana Alonso (Florianópolis/SC) e Cristina Turdo (Argentina) sobre a improvisação em seu modo espetacular e sobre se a improvisação seria uma dança não planejada, um espaço para o risco, acaso e imprevisto; e quais seriam as consequências desta escolha no impacto com a plateia. Um público composto por dançarinas, coreógrafos, produtoras culturais, professoras e pesquisadoras universitárias participantes do Múltipla Dança, contribuíram para enriquecer o debate.

A mediadora Zilá Muniz inicia o debate ao fazer referência à composição instantânea como um processo presente na dança contemporânea, e ao destacar sua natureza experimental. Esclarece que não se trata de um trabalho sem rigor, mas pelo contrário, exige olhar crítico de quem dança, tão necessário para não se correr o risco de não aprofundar na pesquisa do movimento.

Ana Alonso indaga se é necessário buscar sempre o novo. Ela percebe a improvisação como comunicação. Defende a importância da presença na cena, mais que o movimento inovador. Afirma o corpo como presença: o aqui e o agora.

A improvisação é um grande tema na vida para Cristina Turdo. Para a professora, improvisação é sua vida. Um caminho de crescimento. Se a arte não é crescimento, não é arte. Apresenta a improvisação como paradoxal e revolucionária. Ao improvisar, busca o suporte, um lugar para voltar, uma âncora que assegure não nos perder na múltiplas possibilidades que esse processo propicia. Observa que sem a censura de um juízo de certo e errado, as crianças são as melhores improvisadoras.

Noto que há na improvisação uma interação de presença e ausência que merece ser investigada, tendemos a enfatizar a presença na dança, mas a ausência também requer atenção. Deveras, a improvisação proporciona uma experiência mais interativa com a dança que desvela algumas intuições acerca desse tema instigante.

Compreensão


Na noite de quinta-feira (27 de maio), ocorreu a conversa orientada sobre a nova pesquisa coreográfica do Grupo Cena 11 Cia. de Dança, intitulada: SIM > ações integradas de consentimento para ocupação e resistência, mediada pela professora Fabiana Dultra Britto (BA), e tendo como participantes o diretor e coreógrafo Alejandro Ahmed, o elenco composto por Adilso Machado, Aline Blasius, Cláudia Shimura, Jussara Belchior, Karin Serafin, Leticia Lamela, Marcos Klann e Mariana Romagnani e a plateia do Múltipla Dança.

Uma tarefa foi solicitada: que formássemos três grupos para descrever a experiência de compreensão e o sentimento do SIM. Tal ação me pôs a pensar acerca da compreensão, que na concepção de Hannah Arendt é interminável, começa com o nascimento e termina com a morte, é a maneira especificamente humana de estar vivo. Como plateia “teste”, escolhi ficar no grupo para descrever a compreensão da coisa. Em três começamos a tarefa, descrevendo a nossa atitude frente à coisa: distanciamento de uma, aproximação de outra.

Mas, o que é descrever a compreensão de uma experiência vivida acerca de ocupação de espaço e resistência num ambiente cênico? Refleti acerca da necessidade de compreensão mediante a resignação para conferir sentido e produzir novidade no espírito e no coração humanos. Faltou-nos tempo para cruzar o abismo entre experiência e a compreensão dela. Nessa ausência, notamos a essência do interrogar-se. Uma atividade tão peculiar de descrever uma experiência e o entendimento racional e afetivo no contexto da dança é pouco usual. No entanto, nesta situação aprendemos juntamente com Arendt que o resultado da compreensão é o significado que produzimos em nosso próprio processo de vida à medida que tentamos nos reconciliar com o que fazemos e com o que sofremos.
Na sexta-feira à tarde (28 de maio), ocorreu a reflexão sobre a economia da cultura, a implementação de ações integradas por meio da constituição de redes de parceria para a profissionalização do trabalho artístico. A proposta incluiu a disseminação de conhecimentos sobre a aplicação de métodos, índices, processos e ferramentas da economia na área da gestão cultural. O diálogo iniciou com a palestra proferida por Ana Carla Fonseca Reis (SP), e foi mediado por Marcos Moraes (SP), que problematizou acerca dos saberes do corpo; Vanilton Lakka (MG) descreveu sua experiência e sua participação na Rede Sul-Americana, e Luciana Ribeiro (GO) enfatizou a necessidade de mapeamento da dança no país, bem como uma rediscussão no mundo do trabalho tendo como referência a dança enquanto categoria profissional.

No último dia do Múltipla Dança, a todos aqueles que se interessaram em buscar uma compreensão da dança enquanto processo, foi oferecido o programa Ensaios Abertos: Trânsitos, teoria e prática, espaço de mostra de trabalhos com artistas e grupos de Santa Catarina, seguida de discussão sobre dramaturgia com professoras as convidadas Christine Greiner (SP) e Sandra Meyer (SC). Um dos trabalhos foi o Projeto Açúcar, Fel e Afeto, que apresentou Apenas Espécie (título provissório), dirigido por Diana Gilardenghi (Florianópolis), tendo como intérpretes-criadoras Michelle Pereira e Nastaja Brehsan. A apresentação foi seguida de uma calorosa conversa, e a temática acerca de identidade e dessemelhança provocou múltiplas interpretações, tais como imagens reverberadas em espelhos desfocados.



Experimento portátil, uma ação sob encomenda / Foto: Gil Grossi

À noite, Letícia Sekito, da Companhia Flutuante (SP) apresentou no Jivago Lounge seu Experimento portátil, uma ação sob encomenda. A performance propôs uma reflexão sobre possíveis relações entre corpo feminino, fetichismo visual, olhar estrangeiro, comunicação e cultura. Imagens fetichistas femininas – a aeromoça, a garçonete, a dançarina havaiana – relacionam-se com a ideia do olhar estrangeiro, metáfora presente nos vídeos em cena. Com ironia e comicidade, propôs uma interação direta com o público, considerado como um voyeur/’cliente’. Ao voltar para casa após a performance de Letícia me sentia repleta de informações, de experiências, de encontros, trocas. Perguntei como a dança contemporânea contribui para nos sentirmos em casa neste mundo em que nascemos estranhos e permaneceremos estranhos em nossa inconfundível singularidade e retornei a Hannah Arendt, que inspira escrever sobre como uma experiência mais profunda com a dança demonstra que um coração compreensivo, e não a mera reflexão ou o mero sentimento, torna suportável para nós a convivência com outro.

Notações acerca do Múltipla, vi-me desafiada a fazer escolhas. Tal como faço quando acesso um site na Internet em busca de algo que procuro. Encerro aqui minha partitura de gestos textuais com a avaliação da curadora Jussara Xavier pontuando que a maior dificuldade da realização do evento é sempre relativa aos apoios e patrocínios. Considera que o tempo é insuficiente para planejar melhor o encontro, pois sem saber com certeza o volume de recursos financeiros que serão disponibilizados fica difícil agendar principalmente as atrações internacionais. Percebe que a visibilidade e a repercussão na mídia impressa e televisiva foram excelentes. Comenta que os encontros interpessoais que ocorrem entre os participantes e geram outras possibilidades de realização nos deixam bastante contentes. Certifica que foi um momento de troca intenso e rico. Finaliza ao dizer “ficamos muito satisfeitas e estimuladas a continuar, repensar e ajustar os encontros e atividades as necessidades locais. Para nós, é vital descobrir o significado do Múltipla Dança para os artistas da dança de SC, então acho que seria mais bacana se você os entrevistasse para descobrir…” Bem, isso me parece pauta para um outro texto.

Ida Mara Freire tem Especialização em Dança Cênica pela Universidade do Estado de Santa Catarina e Pós-doutorado em Tópicos Especificos da Educação pela University of Nottingham. Atualmente ocupa o cargo de Professor Associado na Universidade Federal de Santa Catarina, Diretora, coreógrafa e dançarina do Potlach Grupo de Dança.

Leia também: Florianópolis de múltiplos encontros

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Tags: Múltipla Dança, notação

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Textos do mesmo autor
■Notações de multiplicidade
■Dança e Comunicação
■Percepção, corpo e cegueira

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Textos relacionados
■A Escrita da Dança: pequeno histórico sobre a notação do movimento
■Múltipla Dança: difusão e incentivo à produção em Florianópolis
■Livro analisa a notação dos movimentos em dança
■Florianópolis de múltiplos encontros
■Múltipla Dança: seminário internacional em Florianópolis

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2 comentários
Sandra | 17/06/2010 - 21:38
Ida,
obrigada pelo precioso registro do Múltipla Dança…e fica aqui a reconhecimento da atuação de Marta Cesar e Jussara Xavier, que a cada ano refinam este encontro cada vez mais necessário aos artistas e ao público catarinense.
Vida longa!!
Sandra meyer

Everson Motta (4° ano de dança Fap | 18/06/2010 - 20:57
Bem é extremamente importantes esses encontros essas discuçoes de corpo, não só pela abrangencia de dialogo que a dança contemporanea traz e sim as possibilidades de discursso que se apresena dentro desse ambitos de pesquisa que sempre são irriquecedores para todos.
deixo aqui o meus parabens a Sandra Meyer, pois acredito que esse novo livro irá abrir novas possibilidades de pesqueisa e conhecimento no meio cientifico da dança.
parabens.

Larissa I. de Godoi (4° ano Dança – Faculdade de Artes do Paraná) | 24/06/2010 - 13:37
Como sempre importante deixar registrado aqui como esses “pontos de encontro”, se assim puder chamar, criam novas ligações, novos pensamentos, novos debates sobre os discursos e as pesquisas que a dança vem apresentando a cada dia. A publicação de um livro que trate de assuntos dessa área vem melhorando com o tempo, o que também deve ser destacado pois tudo que se escreve e é publicado cria espaços e mais espaços para serem explorados nesse ramo de editar livros na nossa área de atuação. Parabéns pelo texto e que o Multípla Dança continue a cada ano.

Ida | 25/06/2010 - 0:53
Agradeço as leituras e os comentários…
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quarta-feira, 21 de abril de 2010

29 de Abril dia da Dança!

Dia da Dança em Florianópolis

O Dia Internacional da Dança foi criado em 1982 pelo Comitê
Internacional da Dança da UNESCO e é promovido anualmente pelo
Conselho Internacional de Dança (CID). A data é uma homenagem ao
nascimento do bailarino e mestre francês Jean-Georges Noverre (1727
- 1810), responsável pela introdução de novos paradigmas de criação
coreográfica.
Celebrado todo dia 29 de abril por cada localidade, é uma
oportunidade de reflexão e discussão sobre a situação local da dança
diante deste momento em que se discute o Plano Nacional de Dança e
se consolida o primeiro Conselho Municipal de Políticas culturais de
Florianópolis.Entre os objetivos, está voltar o olhar das pessoas
para a relevância desta arte e também dos governantes para a
inclusão da dança dentro de novos programas de desenvolvimento para
o setor.

Este encontro acontecerá na Casa da Memoria a partir das 19 horas para discussão das
questões básicas relacionadas à lei de incentivo, editais públicos e
espaços públicos para dança com a presença da representante na
Comissão Permanente de Cultura - Ida Mara Freire, as conselheiras
Marta Cesar e Sandra Meyer e as responsáveis pela dança da Fundação
Franklin Cascaes - Chames Maria S. Gariba.



Serviço
Programação Dia Internacional da Dança
Dia 29 de abril de 2010
Horário: 19 hs
Local: Casa da Memória - Centro de Florianópolis
(Calçadão ao lado da Catedral)
APOIO : APRODANÇA SC

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

O silêncio de Anderson



"Fui interrompida pelo silêncio da noite. O silêncio espaçoso me interrompe, me deixa o corpo num feixe de atenção intensa e muda. Fico à espreita de nada. O silêncio não é o vazio , é a plenitude."
Um sopro de vida de Clarice Lispector

Anderson:entre flores e palavras

Segunda-feira dia 18 de Janeiro de 2010, logo pela manhã recebi o telefonema de Marta Cesar comunicando o falecimento do dançarino Anderson João Gonçalves, ela ainda não sabia que horas seria o sepultamento.
Eu preparava o lanche da pequena Hannah para levar a praia... e tentava organizar o dia de celebração do seu aniversário. Em meu diário escrevi: celebração da vida que florece e da vida que desvanece. Meditei; na quietude do corpo desejei paz e uma passagem tranquila para o amigo que partia. Lembrei-me da dança compartilhada, durante a oficina de Contato que David Iannatelli ofereceu para nós no verão de 2000 ou 2001(datas, dificuldades com o Cronos, já escreverei sobre isso). E aí fomos fazer uma jam lá na beira-mar e eu e o Anderson fizemos um duo na sonoridade da Ave Maria interpretado por Bobby Mac Ferry: meu corpo lembrou.
Em meio dessas e outras memórias o tempo passou, a jornalista do Notícias do Dia telefonou perguntou o que eu poderia dizer acerca do Anderson e comentei que ele era uma inspiração para nós, sua amorosidade, seu corpo certeiro, lúdico, flexível conferia a ele uma maturidade corporal - e aí lembrei dos comentários de Sandra Meyer -enquanto assistiamos sua performance num espetáculo do Cena 11- que conhecia Anderson desde do tempo do Balé Desterro.Foi a partir daí que falei à jornalista do ND que considerava maravilhoso o desempenho corporal do Anderson, para quem estava perto da casa dos 50,pois neste mundo da dança que o bailarino ao chegar próximo dos 30 já pensa em mudar de carreira, nosso amigo fazia questão de provar o contrário e nos inspirava a ir além...
No sepultamento, segurei um vaso de crisântemos amarelos - ofertados por alguém ali presente - as flores, radiavam alegria, beleza e nos lembravam também que a vida é breve, nos despedimos dele com salva de palmas. "Show is over, say good bye" cantam: Madonna, a amiga Rosângela Matos, outras amigas, amigos, familiares em homenagem. Mas, ele se foi com seus sapatos vermelhos e passou sua cartola para seu amigo Alejandro Ahmed...
Naquela mesma tarde, minha pequena Hannah, acompanhada de amigas, amigos e familiares plantou flores, para celebrar mais um ano de vida, e filosofou ao ver o pequeno pé de hibisco sem flor - uma flor nasce e morre, outra flor nasce e morre. Concordei com ela. É assim mesmo a vida, mas enquanto a flor existe ela perfuma e embeleza o nosso jardim. Grata Anderson por sua bela e profunda existência entre nós.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Mas que celebrar, acolher em 500 caracteres

Mais que celebrar, acolher.
Por Ida Mara Freire

A 14a. exposição dos membros da Secessão realizada em 1902 em Viena, almejava uma versão ideal da arte moderna monumental e enfatizava o processo de criativo. O elo entre as proposições da Secessão e as dos artistas contemporâneos está no olhar do espectador. Tanto o corpo como mártir de Beethoven, as pinturas de Klimt, e a dança que criamos hoje continuam celebrando a diversidade humana e desafiando o público. A diferença se mantém em cena, no corpo e no discurso. O espectador é provocado a perceber para conhecer. Porém, exige-se uma ação muito além da celebração: o acolhimento da alteridade. Afinal, é impossível ser feliz sozinho!

Mas que celebrar, acolher em 500 palavras

Mais que celebrar, acolher.
Por Ida Mara Freire

Para responder esta pergunta vou ater-me à exposição do Friso Beethoven, localizado no subterrâneo do palácio da Secessão, em Viena e criado por Gustav Klimt como parte das obras expostas durante a 14a. Exposição dos membros da Secessão, realizada em 1902. O contexto era de decadência e efervescência política e cultural. Essa atmosfera propiciou a criação de uma associação intitulada de Secessão, interessada em respaldar as proposições dos novos artistas. Estes ofereceram à cidade, “um estilo diferente de evento”, planejada detalhadamente, a exposição buscava encontrar um modo ideal de apresentar a versão dos artistas da arte moderna monumental, e ao mesmo tempo, enfatizar de modo especial o processo de criação do trabalho artístico – tentando assim “aprender juntos”; desejando a harmonia co-existente entre arquitetura, pintura e escultura.

Mas se isso foi o almejado pelos secessionistas em 1902, até que ponto a contemporaneidade se vincula a esse projeto de cunho vanguardista? No meu entender, o elo entre as proposições da Secessão e as dos artistas contemporâneos está no olhar do espectador sobre o corpo. O corpo singular seja apresentado como um mártir, tal como foi Beethoven, e representado nas pinturas de Klimt, ou como ator/dançarino como vemos hoje em cena, continua celebrando a diversidade humana e desafiando o público. Ao escolher Ludwig van Beethoven como mártir, redentor da humanidade, Klimt e seus amigos, vê nele a corporificação do gênio e na sua obra exaltação do amor e do sacrifício capazes de salvar o homem. Tal atitude não só revela a veneração por esse artista, assim como uma busca de solução para as questões que Klimt, já fazia sobre o sentido da existência humana. Outro aspecto que merece nossa atenção trata da reação do público. Muito embora, a 14a. Exposição da Secessão consagrada à Beethoven tenha sido um grande sucesso, o Friso pintado por Klimt, foi visto como desafiante pelo público e a imprensa. Os quais avaliaram o friso como anêmico e rígido, além de considerarem os personagens repugnantes e indecentes. Essa distância nobre do espectador se constitui num obstáculo para que ele se reconcilie com ele próprio e a realidade. Atualmente, a diferença está em cena, no corpo, no discurso. O espectador é provocado a perceber para conhecer. Entrar em contato com o mundo. Essa experiência sugere elementos que assegure uma ação muito além da celebração: o acolhimento da alteridade. Afinal, como já cantou o poeta – é impossível ser feliz sozinho!



Foto de Sandra Meyer,
O texto Dança e Comunicação descreve essa experiência.

Dança e Comunicação

Dança e Comunicação
Por Ida Mara Freire (*)

Muitas vezes já presenciamos ou até já fizemos parte de um certo tipo de conversa em que duas pessoas estão conversando, mas nenhuma está ouvindo a outra. Mas também já testemunhamos algumas conversas nas quais ninguém diz nenhuma palavra e os envolvidos entendem perfeitamente tudo que está acontecendo. Qual será a base para uma comunicação verdadeira? O corpo. Sim, você já observou que é difícil mentir com o corpo. Talvez seja por isso que tentamos, em vão, camuflá-lo com roupas, perfumes, maquiagens, acessórios, tatuagens, cirurgias plásticas, etc. Mas o corpo fala. Com uma voz silenciosa, que diz tudo sem palavra alguma. Na tentativa de nos comunicarmos uns com os outros, uma necessidade se impõe, a saber, que devemos assumir responsabilidade entre o espaço que há entre o meu corpo e o de outrem. De certa forma, é a presença ou a ausência desse espaço corporal que vai determinar se a nossa comunicação é uma fonte de inspiração ou de intimidação. Neste texto proponho explorar como a experiência com a dança pode nos traduzir algumas lições de comunicação que o corpo nos ensina diariamente. Para isso, vou me pautar nas atividades de um curso e de uma oficina de dança e improvisação no início do mês de fevereiro. A organização foi feita por Ana Maria Alonso Krischke, com o apoio das professoras Sandra Meyer e Marisa Naspolini do CEART/UDESC.

Nosso corpo se move como nossa mente se move? As qualidades de qualquer movimento são as manifestações de como a mente é expressa através do corpo que está em movimento? As mudanças nas qualidades do movimento indicam que a mente mudou o foco sobre o corpo, ou seria o contrário: quando nós dirigimos a mente ou a atenção para diferentes áreas do corpo, e iniciamos o movimento a partir dessas áreas, nós mudamos a qualidade do nosso movimento? Seria o movimento um modo de observarmos a expressão da mente através do corpo, e isso também pode ser uma maneira de produzir mudanças na relação mente-corpo? Essas questões podem ser exploradas por qualquer interessado numa aprendizagem tanto experiencial como cognitiva dos sistemas do corpo humano, e talvez tenha sido isso que levou um grupo de pessoas a freqüentar os cursos de verão que aconteceram no CEART na UDESC, tendo como professores convidados Heike Kuhlmann e Ingo Rozenkranz, ambos de nacionalidade alemã.
A introdução ao Body-Mind Centering – BMC (Corpo-Mente Centralizados) pela improvisação de contato possibilita a exploração profunda do corpo através da dança. Ela abre novas perspectivas para o dançarino desenvolver seu trabalho técnico e de criação. Essa foi a proposta de um curso de cinco dias de Heike Kuhlmann, que ensina dança e movimento há doze anos, além de criar performances para adultos e crianças em Berlim. Formada em Educação Física e Dança, Heike possui Mestrado em Coreografia pela Universidade de Leeds, na Inglaterra, onde também incrementou sua formação em Body-Mind Centering BMC (Corpo e Mente centralizados) e Movimento Autêntico com Linda Hartley. Essa formação enriqueceu sua dança, dirigindo seu interesse para a expressão interior do corpo.
Conhecer o esqueleto, os músculos, a pele, os órgãos internos, a respiração, a vocalização; os sentidos e a dinâmica da percepção e o desenvolvimento do movimento tanto ontogenético como filogenético; e a arte do tocar e ser responsivo é a base do BMC. Embora cada um desses sistemas do corpo humano apresente separadamente suas próprias contribuições para o movimento corpo-mente, eles são todos interdependentes, juntos proporcionam uma completa rede de apoio e expressão e sustentação. O BMC está alicerçado em aproximadamente trinta anos de experiências de Bonnie Bainbridge Cohen e seus colaboradores e tem sido aplicado por pessoas de diferentes áreas, como a dança, atletismo, trabalho corporal, educação física, terapias da fala, do movimento, ocupacional, psicoterapia, medicina, desenvolvimento infantil, educação, arte visual e musical, ioga, artes marciais, meditação e outras disciplinas envolvendo corpo-mente. O desenvolvimento do movimento no sistema Body-Mind Centering é apresentado como um processo não linear, mas que ocorre através de ondas sobrepostas.
Nascemos para ser escolhidos, vivemos para escolher, escreve Mia Couto. A dança contemporânea, a partir de suas proposições, tais como sugeridas nesse curso oferecido por Heike, nos faz pensar nas escolhas. O ato de escolher é muitas vezes mais importante que a própria coisa escolhida. Quando não escolhemos, a vida escolhe por nós, e podemos vir a ser vítimas das circunstâncias. No entanto, escolher é uma decisão que deve ser tomada com cuidado, mais precisamente num tempo da delicadeza. Nas dinâmicas da percepção aprendemos que é através de nossos sentidos que recebemos informação de nosso ambiente interno e externo. Como filtramos, modificamos, distorcemos, aceitamos e rejeitamos essa informação é parte do ato de perceber. Tocar e movimentar são as primeiras ações para nos desenvolver. Elas estabelecem a linha de base para a percepção futura através do olfato, gustação, audição e visão. Pela exploração do processo perceptivo, podemos expandir nossas escolhas para responder a nós mesmos, aos outros e ao mundo no qual vivemos. Nossa respiração é influenciada pelo nosso estado fisiológico e psicológico e por fatores externos do nosso ambiente. A maneira pela qual respiramos também influencia nosso comportamento e funcionamento físico. No que diz respeito a nossa voz, através de suas qualidades expressivas, comunicamos para o mundo exterior quem nós somos. Nossa voz reflete o funcionamento de todos os sistemas do nosso corpo e o processo de integração do nosso desenvolvimento. Quando tocamos alguém, somos tocados igualmente. Isto é uma exploração da comunicação através do toque - a transmissão e a aceitação da fluência de energia dentro de nós mesmos e entre nós mesmos e os outros.
A oficina oferecida por Ingo Rozenkranz buscou desenvolver um trabalho corporal que visava nos guiar ao cerne de nosso corpo. Ingo é instrutor de improvisação e meditação. Em seus estudos no Departamento de Esportes da Universidade de Cologne, Alemanha, figuram o teatro físico, dança e teatro e a dança contemporânea. Além de seu interesse pelas filosofias orientais: Tai Chi, Qi Gong, Aikido, junto com Body-Mind Centering e Movimento Autêntico. Ele também colabora na organização do Eastimprofestival e do Healingheartfestival e atua como professor em vários festivais de improvisação e dança na Europa, Israel, Rússia, EUA e Japão.
A oficina que ministrou, intitulada Corpos Sensíveis, teve a duração de dois dias. No transcorrer das atividades Ingo intencionou que nós, participantes, aprendêssemos a observar e ler a nós mesmos e aos outros. Explorássemos as interações e possibilidades dessa escuta. Voltássemo-nos para o pequeno e o possível como sendo necessários para perceber nossas necessidades, buscarmos o prazer em nos movermos, abrindo espaço para que todos pudessem existir. Desfrutar de momentos de meditação e cura integrados aos princípios vindos de diferentes abordagens do Contato e Improvisação e da Dança . Enfim, ao movermos nossos corpos e termos conhecimento de como isso se dá, estamos a um passo de nos ajudar e de nos entregar ao movimento, de modo que fiquemos mais presentes tanto na dança como no encontro com outro.
O Contato e Improvisação, como proposta de uma dança, foi criado por Steve Paxton e é definida como um processo criativo que ocorre quando duas ou mais pessoas se movimentam com apoio mútuo e jogam com a mudança de equilíbrio coletivo. É influenciada por técnicas da dança moderna e por componentes de acrobacia, tendo seus próprios princípios característicos de movimento. Como se destina à relação entre o esqueleto, a musculatura e os reflexos, tal proposta também atenta para as interações entre corpo perceptivo e organismo corpo-mente. Através da experiência direta e da percepção da dança podem-se conhecer novos caminhos que nos ponham em contato conosco mesmos e com o nosso ambiente. O ponto principal desse sistema é simplesmente o prazer de nos movimentar e de usar o nosso corpo. É o prazer de dançar com alguém de um modo não planejado e espontaneamente, em que cada pessoa está livre para inventar, sem estorvar a outra. Resumidamente, as qualidades do movimento valorizadas no contato e improvisação são a geração de movimento através de pontos mutáveis de contato entre os corpos; sensibilidade através da pele; rolar através do corpo, focalizando o segmento do corpo e movendo-se em diferentes direções simultaneamente; experimentar o movimento a partir do espaço interno; usar o espaço 360º; ir no impulso, enfatizando a fluência e o peso. Durante uma apresentação há inclusão tácita da platéia acompanhada de informalidade consciente de apresentação, modelada sobre uma prática ou jam; o dançarino é apenas uma pessoa entre outras e deixa a dança acontecer por si só; nesse contexto todos são igualmente importantes.
Essas experiências possibilitam apresentar o corpo como base para uma comunicação responsável. Nesse sentido, minha responsabilidade para com outrem é a estrutura fundamental sobre a qual todas as outras estruturas sociais são acolhidas. A dança como uma tradução da comunicação corporal não está dispensada da ética. Nós sempre dançamos com o outro ou para o outro, nós nunca dançamos sozinhos. Dança não é uma uma atividades solitária, mas um movimento solidário. Vale salientar que dançar é a tentativa de ser um com outro. O espaço da dança como estrutura coletiva sustenta a noção de acolhimento e hospitalidade. Improvisar no contato é criar uma dança experimental. Aqui a noção do experimental de Hélio Oiticica se faz valer: “... a palavra ‘experimental’ é apropriada, não para ser entendida como descritiva de um ato a ser julgado posteriormente em termos de sucesso ou fracasso, mas como um ato cujo resultado é desconhecido. O que foi determinado?” Esse desconhecimento nos abre para as possibilidades da dimensão estética ou perceptiva, que propõe uma ruptura com o hábito. Supomos que a experiência da dança que acolhe outrem seja uma revelação de um modo não habitual de estar no mundo. Buscamos no corpo que dança uma comunicação livre, honesta e afetuosa com o mundo que o enreda.
(*) Professora do Centro de Ciências da Educação da UFSC